24.2.09

[do amor, VI]

- branco no prêto - é isso que ela diz, há horas, intercalando outras frases, que não absorvo. - prêto no branco.
infinitas vezes me rio, com cara de quem ouve. me pergunto, por que te amei. eu já nem sei se amei, ora-vejam-só.
- eu te amo, como branco no prêto. - diga outra coisa. por favor. me fale de música, me conta uma história de quando era pequena. me diz o que almoçou. por favor. - sem você sou pá furada.
não, não cita ninguém, ameba. e se for citar, cita o jabor. cita o sílvio santos. que daí eu rio. pelo menos isso. me diz de você, me deixa te tocar. os floreios da fala me dão coceira. umas metáforas de bar, on-the-rocks-com-gelo. vai, evolui.
- me beija.

tento me lembrar de josé de alencar, camilo castelo branco. qualquer um. até camões serve. me saboto, como sempre. acumula-se no fundo da garganta uma bola de augusto dos anjos.

(prêtobrancoprêtobranco).

um escarro cinza te cobre a boca.

[essa cidade m'atravessa]

e então, sofro. de um jeito bem humano, bem simples, sofro.
o âmago desvira-se e o desmistério de não haver mais vida devia virar sorriso, revirar de olhos, mas não.
é d'uma solidão de dar pena.
dó.
do pó ao pó.

--

sofre meu ventre, de ser botão. o ventre em flôr, nunca que verte-se mel, é sangue. latino, d'alma. sangue. sofre o mistério da sua fraca existência, de sua espera cotidiana.

espera o dia, espera a vez, espera o sal.







.eu só espero que o tempo saiba voar.

20.2.09

[eu não moro mais em mim.]

eu chego a tempo de ver o navio sumir no horizonte. chego no instante em que cai a cortina vermelha, os aplausos irrompendo. ainda que eu nem vá, eu posso ver a porta fechando, as pessoas cansadas, o relógio.
eu chego a tempo, no minuto exato, de saber que sempre estive atrasada. te ligo pra dizer que eu não fui ontem, e que eu nem iria mesmo.
quebro o tempo, enquanto ele me engole.
a reboque, espero cansada a próxima vanguarda.
o suspiro não é o suficiente, seco o suor gelado que me empapa o corpo, corro mais meio metro, para trás.

[está quase na hora de perder o último trem.]

13.2.09

Bordado de Garôa e Sol

Escolho as cores, recorto os tons. A luz que invade é poesia, as letras são de bailar. seguro a mão da menina-mulher que vive através, do meu espelho.

O sorriso dela, reflexo do meu. Eu (em) ela - pelas mãos, que se encaixam. Uma apoteose de acordes em par, fazem palavras surgirem de dentro - em nós - que se embolam. Dançamos as letras-notas. A menina do anel-de-lua faz céu onde meu eu-estrela navega. Azul, que me afaga. Nela, os olhos de cais. Desembarco.

No fim do arco-íris tem o mar. Um mar de nós, de dedos que nunca se embolam. As ondas fazem hiato, de tempo; as ondas são a constância do desejo. Os olhos tem fome, e o tamanho do mar é tanto que já nem sei comê-lo. Devoro aos poucos as palavras que escorrem pela boca, melam os dedos, fazem soluço-de-riso.

[Suspendo a respiração, e de olhos fechados espero o próximo ato.]

Em ondas que lambem o inteiro, um lambuzar de cores. Um som de violão bêbado nascendo em meio aos ruídos monótonos. O riso-sorriso dela, ecoando em minhas pálpebras-borboletas. Visto coroa de guirlanda, princesa que brincava de ser, no faz-de-conta sinestésico. Felicidade, era a lei. E se um dia foi diferente, a noite, espiralada, não deixava ser. Virava tela, em cima da pedra mais alta.

Colho no ar umas bergamotas-de-poesia, eita coisa bôa que é lambuzar-se da palavra alheia! sorvo seus existires, para que haja docêde, em mim (é que vós tens nome dôce!). Misturo o eu no tu, pra ver se desvira numa prosa bôa de ler, comer. Num desenho mágico, de bailar os olhos.

Começo a tecer um arremate pra nossa meada, e é com vontade de fazer um cachecol de dar volta no mundo todinho, que amarro o fio, picoto a linha, vejo nossa obra com olhos de sete-anos, sete-mares, três-marias: duas-metades.


- palavras de duas.

11.2.09

[toco teu silêncio]

espero. espero infinitamente o que eu sei que não virá.
antevejo os risos, os gestos. respiro lembranças e sofro, do não solidificado.
perdoo o que já nem é mais culpa, mato o pouquinho de desmemória que existia em mim.

sofro mais dores do que de fato haviam; os miados insistentes do lado de fora da porta confirmam meu azedume.

5.2.09

[dôcissolidão.]

gato, aspirador, ventilador.
orwell, vertigo, selos.
dossiê?
google, pipoca, café.
louis garrel, eva green, michael pitt.
morango, lichía, atemóia.
mixirica, banana, graviola.
manga, jabuticaba, amora.
vestido, calcinha, chinelo.
edredon, alfomada e meia.

o dia chega a ter mil horas,
e numa noite de sono não conto até dez.



[hoje, lavei as asas. mas choveu.]

4.2.09

[nunca te vi!]

- O que aconteceu com você? - o espelho, impassível, teimava em não responder. Me olhava com uma cara cínica. Deslavada. Inda bem que essa cara não era a minha.

---

o caso é que dei pra escrever, assim, aos litros. pro blog, tenho uns cinco textos por dia. e olha que ando trabalhando feito o cão. cartas, tenho envelopado uma atrás da outra. (a sua está pra chegar, é só esperar um dia ou mais) e as declarações? declaro saudade a todos que vieram, aos que ainda estão. declaro amôres que eu nem senti.
na falta de sentir qualquer coisa que não saudade, enchi minha veia de melancolia. a melancolia virou palavra, agora eu que me aguente.
(preciso de envelopes, selos, uma agenda e uma parede maior, para mais poemas.)

---

- O que você quer fazer hoje? - e me respondeu repetindo a minha pergunta cretina. - FODA-SE.

(então saí de casa, deixei a cara no espelho - com cara de bunda, diga-se de passagem - e fui ser cafajestona. voltei afoita na hora do almoço, corri até o espelho do banheiro.)

- EU QUERO DIVÓRCIO.
Selamos a decisão com um paralelepípedo e muitos olhinhos que me olhavam do chão.

3.2.09

[do amor, V]

(o pior dá solidão, é quando tem gente e o vazio persiste. um homem deitado na minha cama, e eu fujo da pele. porque o hiato é maior que o hífen. o hífen tem o tamanho da rio-são paulo, e persiste.)

2.2.09

[olhalá!]

eu inventei, e queria todo mundo pra dançar comigo.
de cabeceira.

(quem quiser, é só falar. e entrar na dança.)

1.2.09

[do amor, IV]

mais uma noite vazia, mais uma noite sozinha.
pela primeira vez johnny, o gato preto, o mais bonito e que nunca estava no mesmo ambiente que eu, me pediu carinho.


- quando a solidão pede carinhos felinos, é hora de encontrar alguém na rua.