31.3.09

[sometimes, sometimes]

simplesmente não compreendo como alguém pode viver sem fumar. priva-se, por assim dizer, do que há de melhor na vida. em todo caso, lhe escapa um prazer magnífico. quando acordo pela manhã, já me alegro com a idéia de poder fumar durante o dia, e quando tomo uma refeição, já penso em fumar depois. sim senhor, posso dizer, com um pouco de exagero, que como apenas para ter uma oportunidade de fumar. um dia sem tabaco seria para mim o cúmulo da insipidez, um dia totalmente vazio, sem o mínimo atrativo, e se eu qualquer dia despertasse sabendo que não poderia fumar, acho que nem teria coragem de para me levantar.

francamente, eu ficaria na cama.



a montanha mágica.




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tomem nos seus respectivos! e nem saiam da cama, podesser?

25.3.09

[ v i n t.a g e ]

Quando deu por si, estava ali. Parada à porta. Não se lembrava do caminho que havia feito, só se lembrava sempre de fugir das portas. E lá estava. Em frente a uma porta. Meio sem jeito, sem poder ir pra outro lugar, bateu.
- Eu te esperava.
A jovem que abriu a porta, parecia cansada, mas sorria. Qualquer coisa de familiar naquela sala, com tantas moças parecidas, com tantas crianças de mesmo sorriso.

- Parecia que você demorava...!
- Eu avisei que vinha?
- Nem precisava.

Estava confusa. Não sabia aonde estava, nem o que tinha feito, por merecer. Olhou pela janela, e a casa era toda torta. parecia tomar conta de mil caminhos. Aliás, ela via pouca coisa que a casa não cobria.
As crianças eram estranhas. Tinham qualquer coisa de familiar, e um olhar opaco, um sorriso perdido, estavam lá, n'outros caminhos, não na sala. Umas meninas mais velhas odiavam tudo, isso estava estampado. E agora, essa última. Um sorriso de perdão, como quem entende a dor, e sabe fazer diminuir.
As fotos, os brinquedos, uns baús bem pequenos, cheios de segredos, enfiados pelas sombras. As cores. A casa parecia recém-pintada, as cores pareciam velhas, mas ainda bonitas. Tocava uma infinidade de músicas, simultâneamente. Mas, elas ornavam no conjunto. Era a maior casa que já vira, ainda que vista de certos ângulos, fosse não maior que um quartinho de fundos.
Livros forravam as paredes, tapetes se sobrepunham pelo chão. Ela SABIA que coisas ali eram irreais. Mas tudo era, com a licença maior de ser-sem-razão.

Chegou como um susto, como um estupor. Estava na casa de seus dias, sozinha. Levando a enorme carga de sua ultra-existência. Soube que carregaria cada uma delas; em seus braços, suas costas, arrastando pelo chão.
Enquanto houvesse casa.

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Foi quando abri minha porta de destino, aceitei meu passado. Dei a mão a tantas de mim, que sempre me esperam chegar.

19.3.09

[vintage]

2000 foi o pontapé inicial. Antes, era tudo hipótese, tudazul. Antes, era bom.
Sucedeu-se 2001. O poço.
2002 foi o ano do desarmário. Tantas portas de que saí, eu nem me lembro mais.
2003. O ano que não sobrou nada. Perdi até o que não tinha nuncamente achado.
2004 foi anossó. Só eu sei, das esquinas por que passei. Só eu sei.
De 2005, rojo, eu sinto falta. Meu eterno verão de 68.
2006, o ano sem ano. O maior hiato. A maior transição, o ano que não foi ano. Foi passagem.
Em 2007, foi tudo o nôvo. Não repetiu-se uma vírgula.
2008. Unfair.
2009. doismil-enóve. Cigana, latina, cativa.

13.3.09

[pétala]

Toda mulher é lua.
A inconstância. A mutabilidade. O imprevisível. A mulher, crescente.
Num crescente constante de amôr, de sensualidade. De força, coragem, desperta a fêmea, dentro de si. A leôa.
Num ápice, é cheia, plena repleta. Manda o mundo. Ama, vive, faz sexo. Domina os olhares que destila. Olhos de atordôo. Sorriso de pédra e névoa.

Faz-se cadente. Chora. Sofre, dói. Feraferida. A mulher se desvira em fragilidade, em lágrimas, em carícia.
A solidão. Eterna, ela sabe ser eterna.
[Só dorme nos braços de Chico.]

Sangue.

A mulher sangra. E o sangue é a sua eterna redenção. A mulher verte o mundo. Quase some, some.
A mulher dorme, feito a lua nova, que se esconde. E quando ressurge, é outra. De amôrnovo, de outra vida, outro destino. Desvira a vida num mistério opaco, de crescer-se, denovonovamente. Emerge do mar de lágrimas que ela mesma chorou.
Faz-se sêca, e bela.
Pede a cada estrela fria, um brilho de aluguel.

11.3.09

[ l a c u n a ]

não te dizer o que eu penso
já é pensar em dizer.
(e o esforço pra
lembrar é a vontade de esquecer.)

não foi de propósito. beijou cada uma das bocas, lembrou das posições que mais agradavam na cama, as fez.
na sucessão cruel de músicas, cada amante abria abrupto a porta, estuprava suas lembranças, com uma doçura e uma rudeza que ninguém pode ter, só nas hipóteses, mesmo.
nenhuma lembrança falaciosa teve casa, só o mais cruel do real. não teve força. apertando um botão e a dor podia cessar, mas o rádio rolava o mais tétrico que havia de som.
amor era uma hipótese distante, e sofrer era de muito mais gosto e gozo. amor era uma mentira de outros tempos, que ela insistia em fingir acreditar-gostar-sentir.
ela já não era mais eu. e eu, mais ela que nunca.

(lacuna inc. é o caralho, quero sofrer até não sobrar nada.)

8.3.09

sobre como eu me tornei um monstro.

não, eu não vou repassar nenhuma foto de nenhuma criança desaparecida.
afinal, eu sequer olho pras possíveis crianças desaparecidas, vivendo na rua. nem você olha. tá, meu bem?

e se é pra viver de hipocrisia, eu não vou fingir que faço algo. ei, olha aqui:
SOU UMA TREMENDA ACOMODADA! ouviu? é, isso mesmo.

eu não vou panfletar porra nenhuma. eu sei e você sabe que andar na paulista não muda nada.
quer mudar? bacana. molotov no congresso, amygho.

socialismo está morto.
o cristianismo, o humanismo, o caralho-at-four, o amor ao próximo.
só sobrou a hipocrisia.

pra mim, já basta.

4.3.09

[das abstrações.]

- você se importa?
- acho que não.
- tá.
- não, espera.
- que foi?
- me irrita.
- o que?
- isso.
- mas 'cê disse que não se importava.
- não importa. mas irrita.
- quer dizer que importa, então.
- não.
- porra...
- tá, faz o que você quiser.
- mas eu te perguntei.
- e eu te respondi.
- tá.
- tá.
(...)
- mas pra você tudo bem?