17.11.09

Manual Lua da Crise & Caos. Lição 1 - Preparo para a crise: o contexto psico-emocional.

Não pense que é fácil. Não pense que é simples. São 20 anos de prática, e às vezes eu ainda preciso de ensaio. Mas levando em consideração que tem gente que não consegue ter uma crise porque o black dog não tem mais salsicha de soja, eu posso dividir com os pobres ponderados e pés-no-chão umas dicas de crises bem feitas.
É preciso planejamento, prática e cara de pau, muito e grande. Por partes.
É preciso de um motivo absurdo. Crise porque perdeu o emprego qualquer zé ruela pode ter. Foda mesmo é ter crise porque a Risqué não produz mais o Cereja. Isso sim é motivo pra uma crise. Mas quero abarcar uma maior parcela de meus (oooooohohoho) leitores. Então, vamos usar um motivo realmente doloroso.
Motivo: Você não pode ir a um show dos Beatles. N-U-N-C-A. Antes de rir, pense bem. Você NUNCA vai poder berrar BlackBird com os braços pra cima, enquanto o J. Lennon aponta do microfone pra galerê. Você NUNCA vai poder beijar o homem/a mulher da sua vida enquanto a guitarrinha de Something faz corações derreterem. NUNCA vai ter uma tag de foto no orkut na setlist colada no chão do palco, e a bordinha do pé do Paul. Sacou? É dramático.
Posto isso, fica tudo muito simples. Mentalize a sua necessidade física de ir ao show dos Beatles. Repita mil vezes: eu vou a um show, eu vou a um show, eu vou. Assista vídeos. Ensaie cenas. É preciso acreditar que você poderia ir se não fosse...
... Agora vem a parte difícil. A Arte de Atribuir Culpas Aleatórias.

[em breve, ou não.]

15.11.09

fluxo inconsciente

um espécie de desmedo, o que é novo.
uma espécie de amor vadio, que é velho de guerra.
eu sei que você sabe que eu não ligaria, mas acho que ficou aquele cheiro leve de susto no ar, que faz as narinas ditalatarem umas vezes seguidas, que é quase imperceptível (o movimento, não as narinas, .) mas denunciam qualquer coisa de ilegal que anda correndo pelas teias.
a mesma velha mania, os vícios nem velhos nem novos, só depende de onde você está olhando.
eu devia mesmo era ter ligado e dito: te amo a valer, otarel, mas isso só tornaria as segundas-feiras ainda mais obscuras, que não existe amor que sobreviva a uma segunda de manhã, mas isso é outra história, porque as segundas estão aí, não que alguém esteja sofrendo mais que o comum por isso.
e daí que eu devia parar com as drogas, porque eu realmente acho que tudo isso é só uma grande encenação, e que deve ser do jeito que eu quero, porque além de tudo sou insuportavelmente mimada, e olha só. olhando daqui eu me acho bem normal - o primeiro que disser que eu sou a rainha do dramma e da crise absurda será torturado com requintes de crueldade.
não que alguém se importe com essas coisas - vocês já pensaram que a gente deveria limpar as idéias com cotonete? deve ser por isso que eu tou surda, o cérebro fica meio longe de ser alcançado com as tais hastes flexíveis, porque ninguém me paga pra fazer propaganda - e não que isso fizesse alguma diferença pro império-de-limpadores-de-ouvidos.

reavaliando o que eu digo, porque tenho mudado de idéia como quem toma água, (e sim, porque as idéias tem que entrar, antes de sair. isso deve ser a linha de algum filósofo francês, ou alemão de algum-qualquer tempo, revisitando aquele grego que eu não li porque nem sei quem é) desencana de jogar bom senso na caixa d'água do mundo, bom senso serve de nada, te juro.
taca lsd que eu aposto como as coisas melhoram. e se piorar... bem, não dá muito pra ficar pior, dá? a menos que as baratas voadoras tenham idéias mirabolantes, mas daí é fugir da realidade, , minha gente.


e serve um wiskinho pra tia lua que hoje tá dose de ser eu.

9.11.09

dicionarizada.

devir.
1. vir-a-ser;
2. fluxo permanente, movimento i n i n t e r r u p t o , atuante como uma lei geral do universo, que dissolve, cria e transforma todas as realidades existentes.

escrevo, que sou amante das palavras. e te escrevo, que sou, colhendo todas as hipóteses, amante sua. e quando te nomeio de-vir, meu devir, é que gosto de saber que mês longe num rasgou nossas primaveras, e ainda há flor, pássaro e néctar.
e de vir, de tempos. que já vão longe, e soube unir duas pontas distantes, nesse sul e nessa sampa.
te dissolvo, te crio, te transformo, te como inteiro pra saciar meus desejos, e é dum desconhecimento qualquer que me apaixono. que nem sei se ligo, dessas realidades intangíveis, de te ter tão longe.
quero lamber teus mistérios com a ponta da língua - e hão de ser doces. quero te ter, pequeno, e saber teus gostos, segredos, agruras e prazeres.

me conta, de você?
e agora, espero e guardo, um beijo que quero, da boca tua a devorar a minha, e eu a roubar teus ares, e num afã desesperado, ser pele, saliva, hipótese e gozo.

3.11.09

a day in the life.

black bird me acorda, cada dia um tanto mais cedo. cada dia soneco menos, cada dia levanto mais rápido, de um sono sem sonhos, e curto.
antes de botar os pés no chão, tateio o criado de improviso, engulo 2 pílulas com mais água do que o necessário, e a sede é muita.
me roubaram uma hora de vida, e são paulo ainda tem aquela cor encardida do amanhecer,
que eu quase não vejo. a janela quebrou, e não tive tempo de ligar e dizer: quebrou. arruma?
sem nem sentir qualquer gosto, engulo um pote de iogurte, que me salve da gastrite, que cultivo carinhosamente os dias todos. gosto mais de sair pra subir a rua, olhar os ipês amarelinhos, e roxos, enquanto trago os cigarros furiosamente.
alguém grita qualquer música saxã na minha orelha, que os dias azuis da tropicália já se foram, e só a saudade não é o bastante pra trazê-los de volta.
trabalho.
cada dia menos tempo de tirar os óculos, cada dia menos tempo de jogar conversas fora. aceito mais trabalho pra casa.
cada dia mais amarga, mais séria e menos colorida.
anseio o almoço, tomo uma sopa de pacote, que daí tenho mais tempo pra mais cigarro e mais trabalho.
tenho medo de virar uma workaholic desendinheirada, pelo simples prazer de encher esses dias em que já não amo pessoas com qualquer coisa que pareça justa, ou interessante.
anoto na agenda coisas interessantes que o cansaço ou o trabalho não me deixarão fazer.
no ônibus, penso se devo acender um cigarro, mas eu nunca acendo. em casa, como enquanto vejo uma novela qualquer, que eu odeio, mas vejo.
jogo umas conversas fora, asso, recheio, confeito cupcakes, que não como. sorrio amarelo pra minha mãe, e tenho medo do dia em que ela morrer, e nisso eu penso todos os dias.
não planejo o fim de semana, não planejo os dias, não planejo coisa alguma, só espero.
deixo o relógio avançar até o limite, nunca depois das 3: eu já evito olhar pra saber que me atraso pro sono.
fumo um último cigarro, odiando o corpo todo, amando o cabelo todo. a bolsa da natação me espera. ansiosa, suponho.

ajeito as almofadas, de modo pode deitar e ler umas mafaldas antes do sono, sem sonhos. um minuto antes de dormir, tateio o criado de improviso.
ai de mim, se as pílulas não estiverem lá.

1.11.09

Se chover, não beba gim tônica

São 7 horas de sexta-feira e você está no bar, cercado de amigos, pedindo a primeira dose de gim tônica. O clima está legal. O da mesa de bar, porque lá fora está chovendo uma daquelas chuvas que derrubam barracos, geram discursos vazios dos governantes e manchetes sensacionalistas. Você está cansado depois de uma semana de trabalho. Tudo que você quer é ficar ali, jogando conversa fora e gim tônica pra dentro.

São 9 horas, a chuva é a mesma, mas os assuntos variam. Começa-se na política, passa para o futebol e, como sempre acontece naquela mesa de bar, chega-se ao sexo. Especificamente, fala-se sobre a melhor trilha sonora para uma boa transa. Você chega a opinar, dizer uma bobagem qualquer. Mas prefere calar. É o tipo do assunto que é melhor ouvir do que falar. Afinal, você vai perder qualquer chance de traçar aquela ruiva com sardas que está sentada do outro lado da mesa quando ela souber que você gosta de transar ouvindo A Voz do Brasil. E o pior, ouvir da sua própria boca, a mesma boca que pretende percorrer e contabilizar todas as sardas daquele corpinho cor de morango com chantili. Mas você é prudente. Prefere reservar sua boca para a gim tônica.

Já é meia noite. A chuva está ainda pior, mas você nem percebe mais. A mesa se reduz a 5 pessoas, entre elas a ruiva. Depois do sexo, todos fumam e o papo chega até o significado da vida. Agora, você não tem medo de dar opinião. Até porque pelo nível de idiotices, qualquer coisa que você disser vai parecer um poema do Fernando Pessoa. E já que o nome dele veio à cabeça, você decide citá-lo. “O Binômio de Newton é tão belo como a Vênus de Milo. O que há é pouca gente para dar por isso”. Mesmo sem entender o que sua frase tem a ver com o assunto, todos dirigem seus olhares cheios de admiração para você. Que até pensa em citar a fonte, mas conclui que é melhor ficar com os créditos. Pelo estado de embriaguez geral, ninguém vai se lembrar da frase no dia seguinte. Você vira um copo cheio de gim tônica e muda de cadeira, sentando ao lado da ruiva.

São 3 e meia. A chuva torrencial se transforma em chuva de granizo. A única mesa ocupada no bar é a sua. Que agora tem só 3 pessoas. Entre elas, a ruiva. Você fala coisas ao pé do ouvido dela. Ela ri. Você só não é o mais bêbado da reduzida mesa, porque a ruiva mal consegue parar sentada. Você tenta chamar o garçom e pedir mais um copo de gim tônica, mas percebe que os sons que saem da sua boca não conseguem se transformar em palavras. E mesmo que conseguissem, de nada adiantaria, porque a chuva caindo no telhado inviabilizaria uma conversa até entre vendedores de feira. Você se questiona se a ruiva está entendendo alguma coisa que você diz e conclui que não, que ela só ri dos grunhidos que você emite porque ela quer sentir sua língua percorrendo aquele corpo cor de morango com chantili. Quem sabe, até lambrecado de morango com chantili. Você ouve um som ao fundo. Talvez alguém esteja tentando falar com você. Mas você não consegue entender nada. E como você também não consegue ser entendido, resolve se expressar através das mãos. Mais precisamente, enfiando sua mão direita no peito esquerdo da ruiva. Qual não é sua surpresa quando você leva um tapa à la Splish Splash. Não, não foi a ruiva, que inclusive parece estar gostando bem da situação. Então, você percebe que a outra pessoa que tinha restado na mesa era justamente sua namorada, que tentava te lembrar aos gritos que ela estava ali, assistindo toda aquela vergonhosa cena. No dia seguinte, já com o calor da situação resfriado, você a convence de que não foi bem assim, que ela também estava muito bêbada e que acabou vendo mais do que realmente aconteceu. É uma batalha dura, mas você vence pela insistência. Ela te perdoa, mas impõe uma única condição: gim tônica, nunca mais.

Manuel Rolim



e isso eu li aqui, viu? tudo que eu queria dizer, achei já escrito. e me mantenho no meu direito de me manter calada.