3.3.11

A lógica do corpo.

Eu abusei, ele cede. Não é porque eu acho que andar na chuva faz bem pra alma que o corpo também sinta isso. Também não é porque eu não veja sentido em trabalhar tanto e não poder ficar acordada a madrugada, se eu quiser, que vai estar tudo bem. E não é porque eu me sinto um pouco doente que isso seja motivo para engolir um monte de remédios. Foi de pouco que eu adoeci, vai ser de pouco até me reestabelecer.
A cultura do harder, better, faster, stronger não aceita que o corpo sabe se cuidar. Não adianta só comer porcaria o ano inteiro, nunca tomar água e quando adoece se encher de vitaminas. Vitaminas são processo, não panos quentes. As pessoas acreditam ter o controle de tudo. Agora liga, agora desliga; agora trabalha, agora descansa. O corpo faz o seu próprio movimento e eu não vou me opor a isso. Estou doente, e é o que tem pra hoje. Eu não vou tomar pílulas de cafeína para estar mais ativa no trabalho, eu já estou aqui, quando preferia estar na cama.
Eu me respeito, eu tento me entender organicamente. Eu queria que as pessoas se enxergassem não como reféns do seu corpo, mas como o seu corpo. Me agonia as constantes reclamações de estar gordo, estar velho, estar dolorido. Parece uma sabotagem do corpo a tão elevado espírito ali aprisionado. Ninguém se dá conta que o corpo está fazendo o melhor, de acordo com o que você dá a ele. E é o espelho mais sincero do que se passa nesse espírito.





bônus: A lógica da febre.

Mentira, não existe nenhuma lógica na minha febre. É sempre durante ela que eu atravesso a linha entre sonho e delírio, a linha entre consciência e loucura. Como numa viagem de ácido, a febre deixa a minha pele hipersensível, meu sistema motor amplamente afetado e as alucinações visuais - e sensoriais - tomam conta do tempo em que a febre acontece. Às vezes, as sensações são muito boas, outras vezes, pavorosas.
O corpo me presenteia com o descontrole mental e sensorial que tanto aprecio, enquanto trata de me botar saudável. Ontem, um sonho real veio chegando, cada vez mais perto, e quando eu dei por mim, já não existia o ônibus, só a agulha cantando e as flores de cerejeira brotando de mim. O prazer da dor-agulha, o prazer de ser menina-bordada-de-flor.
Para que eu tomaria antitérmico? Antes da loucura tem sempre frisos e prazer.

2 comentários:

marcia cardeal disse...

A outra febre, a febre criativa já te habita. Intermitente. Que ela tb te ajude a sarar. Mas não sare dela nunca. beijo e cuide-se muito bem.

B.Bonini disse...

Delícia!!!!